Vicente Nunes
Diante do expressivo crescimento do número de fraudes, o Banco Central decidiu apertar as regras do uso de cheques (leia quadro abaixo). Para isso, a instituição colocou ontem em audiência pública uma série de propostas exigindo maior controle por parte dos bancos na emissão desses documentos e dando maiores responsabilidades aos correntistas. Pelas contas do BC, apesar de o total de cheques emitidos no país (1,373 bilhão) ter recuado 36% em 2008 em relação a 2007, o número de documentos devolvidos (85 milhões) cresceu 50% na mesma comparação e, em valores (R$ 75 bilhões), houve um salto de 188%. Em dezembro de 2008, os cheques devolvidos representavam 6,9% do total de documentos emitidos. Em julho deste ano, essa relação estava em 7,3%.
Segundo o chefe do Departamento de Normas do BC, Sérgio Odilon dos Anjos, a consulta à sociedade — qualquer um poderá apresentar propostas — se estenderá por 60 dias. Ele assegurou, porém, que o aprimoramento das regras e o aumento das responsabilidades não custarão mais caro aos correntistas, pois a segurança maior que o cheque terá como instrumento de pagamento compensará qualquer gasto por parte dos bancos para melhorar seus sistemas de controle. “Não vemos porque ter aumento de tarifas. Estamos falando em risco de imagem, que custa mais caro para as instituições financeiras”, disse. Ou seja, um banco com menos problemas com cheques é mais bem avaliado pela clientela.
Para Odilon, o principal beneficiário do arrocho nas regras do uso do cheque será o comércio, que acaba arcando com a maior parte dos prejuízos dos cheques devolvidos, seja por insuficiência de fundos, seja por fraudes. “Queremos, com as sugestões recolhidas junto à sociedade, transformar o cheque em um instrumento mais seguro de pagamento”, frisou. A seu ver, não deverá haver queixas por parte dos correntistas, por serem obrigados a seguir regras mais duras. “O cliente correto, que quer usar cheques, terá mais segurança e, portanto, mais facilidade de aceitação”, acrescentou.
O BC também espera que o cheque volte a ser um concorrente de peso para os cartões de crédito e de débito, ajudando a reduzir os custos dessas operações. Hoje, muitos comerciantes se recusam a aceitar cartões por causa do elevado custo e correm o risco de receber cheques sem fundos ou fraudados. “Achamos que, agora, é o momento de pôr esse tema em debate. O fato de o uso do cheque estar caindo não significa que não devemos torná-lo mais seguro”, assinalou.
Pré-datados
O debate aberto pelo BC traz oito propostas. Entre elas, está a exigência para que os bancos aperfeiçoem os sistemas de controle de emissão e fornecimento de cheques. Atualmente, destacou Odilon, não há normas nesse sentido. Os bancos também terão de informar, nos cheques, a data em que eles foram impressos, pois, a partir de um ano, as instituições não terão obrigação de pagá-los. O técnico do BC garantiu que o objetivo dessa data não é limitar o uso de pré-datados. Mas, certamente, o comércio poderá recusar o parcelamento do pagamento além de 12 meses.
Odilon ressaltou que os cheques já emitidos, sem a especificação da data de impressão, continuam valendo. Também permanece inalterado o prazo de sete meses para a aceitação do documento pelo banco a contar da data de emissão. “Nada muda para os cheques que estão em poder do público, emitidos antes da entrada em vigor das novas normas”, afirmou. Ele destacou ainda que, pelas propostas em discussão, os correntistas terão que desbloquear os cheques recebidos em casa pelos Correios, pois, senão, eles poderão ser devolvidos. Os bancos terão de fazer acompanhamento especial dos cheques que foram declarados inutilizados, mas depois foram usados para pagamento. O cancelamento das folhas em cheques em branco furtadas ou roubadas só poderá ser feito com a apresentação do boletim de ocorrência policial. Os bancos não poderão cobrar tarifas de clientes que tiveram os nomes incluídos indevidamente no Cadastro de Emitentes de Cheques Sem Fundo (CCF). E o comércio terá acesso a um banco de dados para saber o caminho percorrido pelos cheques desde a sua confecção.
O número
R$ 75 bilhões
Valor total dos cheques devolvidos em 2008
O que o BC propõe
- Bancos deverão adotar critérios para aprimorar os sistemas de controle interno sobre o fornecimento e o uso de cheques. Hoje, não há normas nesse sentido;
- Bancos terão que especificar nos cheques as datas em que eles foram impressos. Instituições não terão a obrigação de pagar documentos impressos há mais de 12 meses;
- Correntistas serão obrigados a desbloquear as folhas de cheques recebidas em casa por meio dos Correios. Caso não haja esse desbloqueio, os cheques serão devolvidos;
- Cancelamento de folhas de cheques em branco por motivo de furto ou roubo só será feito pelos bancos se for apresentado o boletim de ocorrência policial;
- As folhas de cheques declaradas inutilizadas pelos correntistas, se apresentadas para pagamento, deverão ter verificação especial por parte dos bancos;
- Bancos deverão fornecer a quem recebeu cheques as informações sobre quem os emitiu, caso os documentos sejam devolvidos por não confirmação do recebimento do talonário. No caso de cheques sustados, os recebedores terão direito à cópia do pedido formal feito pelo cliente bancário justificando os motivos que o levaram à suspensão do pagamento;
- Bancos não poderão cobrar taxas e tarifas de clientes no caso de inclusão indevida de nomes no Cadastro de Emitentes de Cheques Sem Fundos (CCF);
- Comércio poderá acessar bancos de dados para conferir o caminho percorrido pelos cheques, inclusive se eles foram retirados na agência bancária ou enviados pelos Correios.
Fonte: Banco Central.