Aprovado na terça-feira (8/11) pela Câmara dos Deputados, o Código de Defesa do Contribuinte (Projeto de Lei Complementar 17/22) apresenta diversas alterações relevantes nos procedimentos judiciais tributários. E, por causa de tais novidades, mesmo ainda precisando ser apreciado pelo Senado, o projeto de lei já provoca debates entre os estudiosos do assunto.
Uma das novidades na legislação tributária é a instituição da arbitragem para prevenção ou resolução de controvérsias. Método já utilizado em disputas comerciais e empresariais, por exemplo, a arbitragem conta com a participação de entidade privada para solucionar o embate, sem a intervenção do Poder Judiciário.
Para especialistas no tema ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico, a instituição da arbitragem tributária é bem-vinda, mas o Projeto de Lei Complementar 17/22 deixou muitas dúvidas no ar. O advogado Rodrigo Antonio Dias, sócio fundador do escritório VBD Advogados, resume bem a questão:
"O sistema de resolução alternativa de conflitos tributários por meio da arbitragem pode ser um excelente incentivo para regularização de débitos, dar celeridade aos julgamentos e também para definição da interpretação tributária. A questão é saber como isso funcionará. A arbitragem poderá decidir de forma distinta do Judiciário? O entendimento valerá para todas as operações da empresa? Enfim, a iniciativa é boa, mas ainda há muito a ser considerado para entendermos os impactos".
Pedro Almeida, especialista em Direito Administrativo, Societário e Arbitragens do GVM Advogados, vai na mesma linha: "O uso da arbitragem em conflitos tributários já ocorre em Portugal, mas dependerá da superação de alguns desafios no Brasil para se tornar realidade. Um deles será a interface dos tribunais arbitrais com o Poder Judiciário. Hoje, o árbitro não é obrigado a decidir em consonância com os precedentes dos tribunais superiores e não tem a sua decisão de mérito reanalisada pelo Poder Judiciário. No entanto, o Direito Tributário é uma área muito influenciada por súmulas e decisões de repercussão geral, e frequentemente o STF interfere em discussões relevantes, com a palavra final. Precisará ser discutido se a arbitragem tributária terá regras semelhantes à arbitragem comercial, com relação às hipóteses de revisão da sentença, e como ela será influenciada por decisões do STF".
Por sua vez, Maria Carolina Sampaio, sócia e head da área tributária do GVM Advogados, ressalta que o Fisco deverá respeitar amplamente as decisões da arbitragem para que a medida de fato tenha impacto relevante. "As decisões seriam mais técnicas e, possivelmente, mais céleres. Todavia, seu efetivo impacto depende ainda de regulamentação do instituto e, caso o Fisco deixe de respeitar as regras e decisões, na prática o procedimento será apenas mais uma etapa de discussão do crédito tributário."
Pesquisadoras do Insper e advogadas do escritório Mannrich e Vasconcelos, Carla Mendes Novo e Maria Raphaela Matthiesen lembram que existe uma comissão no Senado focada na reforma do contencioso tributário.
"Quanto à arbitragem, dependerá de como a matéria será posteriormente regulamentada e como vai interagir com a transação tributária, recentemente regulamentada pela PGFN e outros entes, bem como com a eventual instituição de mediação, que tramita nos PLs originados pela comissão do Senado Federal focada na reforma do contencioso tributário. É importante que essa regulamentação seja bem trabalhada e objeto de debate público, para evitar futuros questionamentos e inconsistências."
Alessandro Mendes Cardoso, sócio da banca Rolim, Viotti, Goulart, Cardoso Advogados, complementa: "Atualmente estão em trâmite os Projetos de Lei 4.257/2019 e 4.468/2020, ambos tramitando no Senado Federal, que visam a alterar a Lei de Execução Fiscal (LEF) e introduzir a arbitragem tributária. Um dos questionamentos sobre esses projetos era o seu possível questionamento, se não houvesse a alteração também do CTN, lacuna que pode ser suprida com a transformação em lei complementar do PLP 17/22".